Após alguns anos, o sistema de educação pública húngaro se tornou um deserto árido, mas de certa forma altamente funcional. De acordo com a política econômica do governo húngaro, a principal função das instituições de ensino público é treinar operários para as fábricas de montagem (principalmente alemãs) e como empregados de escritório para cargos de gerência de nível médio. Assim, o currículo é centralizado e as escolas não estão mais sob o controle das comunidades locais (anteriormente eram dirigidas por governos municipais, eleitos localmente). Os diretores das escolas perderam poder sobre o funcionamento de suas escolas: da contratação dos professores à compra de giz, as instituições centrais decidem tudo.
No entanto, além da falta de liberdade, o subfinanciamento permanece um problema. Muitos prédios escolares estão em péssimo estado, e os salários dos professores são ridiculamente baixos (para não mencionar o pagamento de outros funcionários escolares); eles ganham apenas 58-66% dos salários de outros profissionais de nível superior na Hungria. Tudo isso é planejado e criou um problema crescente, pois ninguém quer trabalhar como professor nessas condições. Especialistas dizem que em apenas alguns anos a escassez de professores será tão grave que toda a educação pública poderá se tornar impossível.
Este é o motivo pelo qual os dois maiores sindicatos de professores iniciaram novas negociações com o governo em outubro de 2021. Sua greve em março, anunciada na ausência de um acordo, foi imediatamente rotulada pelo Ministério de Recursos Humanos como uma ação de campanha da esquerda. O ministério também pediu aos professores que trabalhassem durante a greve para supervisionar os estudantes.
Pouco depois da primeira greve, o parlamento proibiu na prática que os professores entrassem em greve, ordenando a supervisão obrigatória dos alunos mesmo durante as paralisações. Com isso, houve uma onda de desobediência civil e centenas de professores pararam de trabalhar por curtos períodos de tempo. "A greve é um direito fundamental" foi o lema dos professores rebeldes.
Após o Fidesz obter maioria de dois terços no parlamento, em abril de 2022, e com a desintegração completa dos partidos de oposição após a eleição, protestos antigovernamentais foram organizados em torno da educação na Hungria. Essas manifestações foram organizadas principalmente por estudantes, que entraram na luta como um grupo relativamente novo, e rapidamente se tornaram a força motriz da resistência.
Após a demissão de professores por desobediência civil no final de setembro, quase 40 mil pessoas se manifestaram em frente ao parlamento. Apesar de ter sido o maior ato de oposição em muito tempo, os manifestantes não alcançaram o seu objetivo, e o governo efetivamente ignorou e continua ignorando esses protestos. Sua narrativa é que, embora a demanda salarial dos professores seja legítima (outras demandas são ignoradas), não há espaço orçamentário por causa da atual crise econômica, o que depende, em última análise, da recepção ou não de fundos da União Europeia retidos.
A falta de interesse do governo nos protestos levanta a questão: como pode o Fidesz ignorar os problemas da educação? O défice democrático na Hungria é, obviamente, parte da resposta, mas não explica tudo. Outra parte é que a resistência até agora se limitou principalmente às escolas secundárias urbanas e a classe média urbana, que se simpatiza com a luta dos professores e estudantes, representa parcela cada vez menor da população.
Os estudantes já perceberam este problema e estão tentando criar uma organização nacional sob o nome de Frente Unida Estudantil (Egységes Diákfront). No entanto, a questão permanece: à medida que mais professores são demitidos por desobediência civil, professores, mães, pais e alunos serão capazes de construir uma resistência nacional? Será que a educação por si só é causa suficiente para mobilizar as pessoas? Uma coisa é certa: em vez de protestos sem objetivo, as greves (legais ou não) continuam sendo a melhor arma para os trabalhadores da educação em sua luta contra seu empregador explorador, o Estado.